Matemática e Arte

11/01/2021

Buscando Perceber a Beleza na Matemática


Diversas foram as vezes nas quais eu, diante de um problema ou de uma demonstração, declarei a beleza da Matemática. O mesmo número de vezes eu vi semblantes contorcidos com exclamações do tipo: como alguém pode achar beleza na Matemática. Se você é professor de Matemática, já deve ter passado pela mesma situação.

Meu professor de Geografia da 7ª série (Prof. Manuel era o nome dele, se não me falha a memória) dizia que "beleza é uma questão de latitude".

Eu estava na primeira série do Ensino Médio quando o Prof. Celso Aragão escreveu o poema Cota Zero, de Drummond, no quadro:


Cota Zero

Stop.

A vida parou

ou foi o automóvel.


Imediatamente eu pensei: ah! Isso eu também faço. O Prof Celso ministrou duas aulas seguidas sobre o poema. Ao final das aulas eu concluí: bem, isso eu não faço!

Eu estava no segundo ano da faculdade e comprava os fascículos da coleção Gênios da Pintura. Estava com o fascículo de Mondrian cuja capa apresentava uma tela com um monte de retângulos pintados com cores diferentes. Encontrei com um colega que terminava Belas Artes na UFRJ e, apresentando-lhe a capa com o quadro de Mondrian, perguntei: como é que alguém chama algo tão elementar de Arte? Ele perguntou se eu tinha tempo e me chamou para tomar uma cerveja. Passou uma hora falando sobre o quadro da capa. Elementar era o meu entendimento.

Todos nós temos o direito de, diante da estética de qualquer trabalho, declarar: gostei ou não gostei. Entretanto, devemos ter o cuidado, muitas vezes, de não ultrapassar o gostei ou o não gostei, fixando essa declaração no tempo e no espaço. Com frequência, nossa ignorância, nossa falta de entendimento, nossa falta de convívio com o tipo de trabalho que está diante de nós nos impede de perceber o seu valor estético. É isso que contorce o semblante dos estudantes diante da beleza matemática.

Eu trabalhava no Colégio Renovação, em Nova Iguaçu, quando vi pela n-ésima vez os semblantes contorcidos. Nesse colégio, havia uma sala de Matemática. O professor não saía da sala, os alunos se dirigiam à sala de Matemática na hora das aulas. Isolei um canto da sala e nele comecei a expor quadros, painéis explicativos de algumas obras de artes, esculturas montadas com trabalhos de artistas que usavam a Matemática. A ideia era mostrar que pessoas com a função social de criar trabalhos eminentemente estéticos (os artistas) com frequência usavam a Matemática, criavam "beleza" usando Matemática, enxergavam "beleza" na Matemática. A Matemática tem uma beleza que pode ser percebida.

Após um ano desse cantinho da "Matemática e Arte", havia um número razoável de peças que justificava a montagem de uma exposição. Essa exposição foi montada no Colégio Sion, no Colégio Zaccaria, na FGV e na UFRJ.

A diversos professores de Matemática, alguns deles grandes mestres renomados, perguntei: por que você decidiu se dedicar a Matemática? De quase todos obtive a mesma resposta:

- Porque ela é bonita!






Da minha aldeia veio quanto da terra se pode ver no Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não, do tamanho da minha altura... 

Alberto Caeiro (Fernando Pessoa)